Mentalidades Coletivistas

O maior desafio de um individualista ao tentar esclarecer as pessoas sobre os benefícios de uma sociedade mais livre é tentar, primeiramente, livrá-las dos cacoetes mentais coletivistas que povoam suas cabeças. Não é tarefa fácil: as pessoas são treinadas, educadas e adestradas para pensar e comunicar-se sempre em “coletivês” de modo que parece as vezes até impossível pensar de modo diferente.

Desta mentalidade coletivista brotam jargões do tipo “Brasil para os brasileiros”, “dívida histórica/social”, “luta de classes” e outros absurdos. Eu arriscaria dizer que a mentalidade coletivista é a mãe de todos os preconceitos, do racismo ao sexismo passando pela xenofobia e pelo preconceito de classe. O artigo de hoje propõe uma divisão “taxonômica” da mentalidade coletivista.

Supremacismo
É a mentalidade coletivista que hierarquiza os coletivos humanos (gêneros, etnias, classes, nacionalidades, grupos religiosos) e declara abertamente a supremacia de um sobre os demais. Este que fica no topo tem o direito de dominação sobre os demais. Os exemplos mais claros são o racismo e suas variantes (supremacismo branco, supremacismo negro, etc.), mas também se aplica ao ultranacionalismo, ao sexismo (machismo, femismo) e ao sectarismo religioso.

A contraparte do supremacismo é o submissivismo que reconhece a si e ao coletivo com que se identifica como uma parte da hierarquia que está abaixo daquela dominante. Um submissivista, por exemplo, seria como um racialista negro que acredita que os negros são cidadãos de segunda classe e que deveriam se espelhar e imitar os brancos para melhorar sua condição.

Igualitarismo
É a mentalidade coletivista que reconhece os diferentes coletivos humanos mas propõe que a relação de valor entre eles é a de igualdade, ainda que as características naturais ou sociais deles não sejam. Do igualitarismo também vem a noção de igualdade formal, embora prejudicada pela sua impossibilidade de conceber os seus membros como indivíduos transcendentes que ora estão em um grupo, ora em outro, ou mesmo em mais de um grupo ao mesmo tempo. A relação de igualdade entre os grupos, sem o reconhecimento do indivíduo como ente primário e necessário, força a incorporação arbitrária deste a um grupo.

Vitimismo
É a mentalidade coletivista que identifica nos coletivos humanos uma relação conflitiva entre explorados e exploradores, da qual não raro brota o revanchismo histórico (“dívida social”, “dívida histórica”) ou o irredentismo. O vitimista que se crê parte do coletivo “explorado” demanda políticas compensatórias das quais é beneficiário. Exemplos claros são o protecionismo (vitimismo econômico), a xenofobia (vitimismo nacionalista), o racismo (vitimismo étnico), o feminismo (vitimismo sexista), etc.

A Escola Austríaca e a refutação cabal do socialismo

Artigo original de Alceu Garcia. Publicado originalmente no Instituto Mises Brasil. Para ler o artigo original, clique aqui.

Introdução

O fracasso do socialismo como princípio de ordenamento social é hoje evidente para qualquer pessoa sensata e informada — o que exclui, é claro, os socialistas.  Estes, porém, insistem que o malogro coletivista foi um mero acidente histórico, que a teoria é fundamentalmente correta e que pode funcionar no futuro, se presentes as condições apropriadas.  Tentarei demonstrar nesse texto, recorrendo na medida das minhas limitações aos ensinamentos da escola austríaca de economia, que absolutamente não é esse o caso, que a teoria econômica (para não falar dos fundamentos filosóficos, éticos, sociológicos e políticos!) do socialismo é insustentável em seus próprios termos, e que ipso facto os resultados calamitosos constatados pela experiência histórica são, e sempre serão, uma consequência inevitável de uma ordem (rectius: desordem!) socialista.  Não é preciso enfatizar a importância de se ter plena consciência da natureza perniciosa dessa corrente política e de suas funestas implicações, uma vez que em nosso país um poderoso movimento totalitário está muito próximo de tomar o poder.

O erro dos clássicos

O núcleo do pensamento econômico socialista está na concepção do valor como decorrente do volume de trabalho necessário para a produção das mercadorias, e isso não só em Marx como também em outros teóricos como Rodbertus, Proudhon etc.  Essa teoria do valor constitui a premissa elementar da qual a mais-valia e a exploração são deduzidas.

Retrato de Adam Smith

Marx, como se sabe, não inventou a teoria do valor-trabalho. Ela foi exposta bem antes por Adam Smith e David Ricardo e, dada a autoridade desses mestres, ganhou foros de ortodoxia. É difícil entender como esses dois pensadores notáveis, cujas descobertas foram realmente magníficas, puderam fracassar tão cabalmente justamente na questão crucial do valor. Talvez por causa dos avanços das ciências naturais, que estavam revelando propriedades antes insuspeitadas nas coisas, eles imaginaram que era mais “científico” considerar o valor também como um atributo da coisa.

Vários pensadores antes de Smith já tinham tido o insight correto: o valor das coisas depende da avaliação subjetiva de sua utilidade. O valor está na mente dos homens. Hoje se sabe que os filósofos escolásticos e os primeiros economistas franceses, Cantillon e Turgot, haviam concebido uma teoria econômica superior em muitos pontos a dos clássicos britânicos, sobretudo quanto ao valor. Smith e Ricardo, porém, puseram a economia na pista errada com uma teoria do valor falaciosa e, nesse aspecto, causaram um grave retrocesso no pensamento econômico.

Mas não por muito tempo. Enquanto Marx e outros pensadores socialistas faziam da teoria objetiva do valor a pedra fundamental de sua doutrina, diversos estudiosos já haviam constatado o desacerto dessa teoria e, independentemente, buscavam alternativas. Em todo caso, não seria exagero afirmar que Marx foi um economista clássico ortodoxo e que seus mestres, Ricardo em especial, podem ser considerados os fundadores honorários involuntários do socialismo “científico”.  Por ironia, o “revolucionário” Marx foi um conservador extremado em teoria econômica, enquanto que os economistas “burgueses” austríacos empreenderam uma verdadeira revolução nesse campo científico.

A redescoberta da subjetividade do valor

Vários economistas, entre eles o austríaco Carl Menger, chegaram basicamente à mesma conclusão que seus esquecidos antecessores pré-clássicos: o valor é subjetivo.  A teoria subjetiva do valor — ou teoria da utilidade marginal — resolve o problema satisfatoriamente, sem deixar lacunas.  O valor nada tem a ver com a quantidade de trabalho empregada na produção da coisa, mas depende de sua utilidade para a satisfação de um propósito de uma determinada pessoa.  A utilidade decresce à medida que mais unidades de um dado bem são adquiridas, posto que a primeira unidade é empregada na função mais urgente segundo a escala de valores de cada um, a segunda unidade exerce a função imediatamente menos urgente etc.

“Os Marginais” Jevons, Menger e Walras, economistas que defenderam a teoria da utilidade marginal e lideraram a “Revolução Marginalista” da Economia.

Para um sujeito que já tem uma televisão, por exemplo, ter outra já não tem a mesma urgência — dito de outra forma, as TVs são idênticas, exigiram a mesma quantidade de trabalho na sua produção, mas não têm o mesmo valor.  Cada indivíduo tem uma escala de valores diferente, e o que é valioso para um pode não valer nada para outro. Até para o mesmo indivíduo a utilidade — e daí o valor — de um determinado bem varia no tempo.

Isto posto, é fácil verificar que os preços refletem a interação entre ofertantes e demandantes, cada um com sua respectiva escala de valores. Compradores e vendedores potenciais expressam suas preferências no mercado, condicionadas por suas valorações pessoais e intransferíveis, e dessa interação surge uma razão de troca, um preço, que vai variando para igualar oferta e procura ao longo do tempo, de modo que em um determinado instante todos os que valoram o que querem adquirir (no caso a TV) mais do que o que se propõem a dar em troca (no caso um preço monetário x) conseguem comprar o produto.

O fabricante de TVs, segundo Marx, primeiro fabrica o produto e da quantidade de trabalho por unidade sai o valor e, consequentemente o preço. Isso é precisamente o inverso do processo real.  Na verdade, o fabricante inicialmente faz uma estimativa de um certo preço que ele espera que atraia compradores e esgote o estoque — compradores que valorem mais a TV do que o dinheiro correspondente ao preço.  Em seguida, ele calcula o custo de produção aos preços correntes e, se for suficientemente inferior à receita final prevista, aí sim ele contrata e combina os fatores de produção para obter o produto.  Não é pois o trabalho ou de modo geral o custo de produção que determina o valor e o preço.  É justamente o contrário: o preço projetado determina o custo de produção.

O emaranhado de falácias marxistas

Visando definir o valor com mais rigor do que Ricardo e levar a teoria às suas últimas consequências lógicas, Marx acaba demonstrando involuntariamente a invalidade das proposições pertinentes.  Como seus antecessores, Marx distingue entre valor de uso e valor de troca.  Para ele, as trocas só ocorrem quando coincide a quantidade de trabalho empregada no que se dá e no que se recebe.  Só há troca, pois, nos termos marxistas, quando há coincidência de valor, que por sua vez é função do volume de trabalho dispendido.  Ocorre que essa linha de raciocínio logo esbarra em um obstáculo insuperável: o trabalho é heterogêneo. Na ausência de homegeneidade, não há como tomar o trabalho como unidade de conta e medida de valor. Marx tenta superar o problema com os conceitos de trabalho “simples” e trabalho “complexo”, fixando uma proporção entre eles, mas falha totalmente. Como os preços flutuam, Marx decreta que essas variações são ilusórias; o real é um certo “preço médio” que equivale ao valor, que equivale ao volume de trabalho dispendido na produção do bem.

Ao procurar fugir da rede de falácias que vai tecendo, Marx incorre em uma óbvia petição de princípio que até hoje engana os ingênuos: a medida do valor seria a quantidade de trabalho “socialmente necessário” para a produção de determinada mercadoria.  Ora, só podemos saber o que é “socialmente necessário” investigando o que leva os indivíduos que compõem uma sociedade a valorar uma coisa o suficiente para que sua fabricação seja “socialmente necessária”.  Por que são produzidos mais CDs de axé do que de música clássica?  Por que o pagode é mais “socialmente necessário” do que a música erudita?  Porque há muito mais gente que gosta de pagode do que os que preferem música erudita.

Fica claro que o que foi dado como provado, que o valor depende da quantidade de trabalho “socialmente necessário”, é precisamente o que se necessita provar.  O que é “socialmente necessário”?  É aquilo que os indivíduos desejam.  Sendo assim, é evidente que temos que procurar o valor das coisas nas preferências individuais, não no custo de produção.  Ademais, o trabalho não é o único fator de produção. Marx evidentemente sabe que o trabalho sem o fator terra — os recursos naturais — é inútil e vice-versa.  Ele assevera que só o trabalho humano cria valor, pois a natureza é passiva.

Mas se o trabalho isolado é incapaz de criar valor, o que nos impede de afirmar que o valor depende da quantidade de recursos naturais “socialmente necessários” à produção disso ou daquilo?  E, como toda produção demanda tempo, por que não pode ser o valor definido como a quantidade de tempo “socialmente necessário” para a fabricação de uma mercadoria? Nessa ordem de idéias, mais lógico seria conceber o valor como função da quantidade de trabalho, terra, tempo e capital “socialmente necessários” para a produção de um bem. No fim das contas, é isso mesmo que Marx faz no vol. III de O Capital, relacionando o valor ao custo de produção, contradizendo sua própria concepção do valor-trabalho exposta no vol. I.

Para a teoria subjetiva, todavia, não há mistério e não há exceções: o “valor de troca” não é função do trabalho ou do custo de produção, e jamais pressupõe igualdade de valor.  Se eu dou tanto valor ao que me proponho a trocar quanto ao que me é oferecido, simplesmente não troco.  Só há troca quando os valores são diferentes, quando cada parte quer mais o que recebe do que o que dá.  O contrato de trabalho não foge à regra. Cada contratante valora mais o que dá do que o que recebe, logo não há exploração.  De fato, provando-se a falsidade da teoria do valor-trabalho, invalida-se inexoravelmente a exploração e a mais valia, e todo o edifício teórico deduzido dessa teoria desaba como um prédio de Sergio Naya.

Ademais, baseando-se na “lei de ferro dos salários”, segundo a qual sempre que a remuneração do trabalho subisse acima do nível de subsistência os “proletários” aumentariam a sua prole, trazendo os salários de volta para o nível de subsistência original, Marx assegurou que o capitalismo engendrava a miserabilização crescente do proletariado. Trata-se de uma tese contraditória em seus próprios termos, vez que se a tendência fosse a de que a remuneração do trabalho permanecesse estagnada num patamar de miséria não haveria uma miserabilização “crescente”, e sim uma “miserabilidade constante”.

Na verdade, o padrão de vida dos trabalhadores não cessou de aumentar nos países capitalistas avançados, o que é o resultado natural da liberdade individual de maximizar a utilidade — o valor — nas trocas livres, voluntárias e mutuamente benéficas travadas no que se chama economia de mercado.  A consequente acumulação de capital investido per capita em grau maior do que o aumento demográfico da força de trabalho torna o trabalho cada vez mais escasso em relação ao capital — e os salários reais cada vez mais altos.

Marx, como é comum entre os intelectuais, odiava a divisão do trabalho.  Mas foi o aprofundamento da divisão do trabalho que permitiu o aumento da produtividade do trabalho e o consequente aumento do poder aquisitivo real dos salários.  O “alienado” operário que aperta parafusos na linha de montagem é recompensado pelo fato de que a produtividade do seu trabalho é tal que lhe permite adquirir produtos antes sequer existentes e ter um padrão de vida muito superior ao artesão autônomo do passado que controlava todo o processo de produção.

Marx acreditava que a livre concorrência levaria a uma superconcentração do capital. Na verdade, a concorrência força sem parar a redução de custos e preços, resultando em uma melhor utilização de recursos escassos e os liberando para emprego em novas linhas de produção.  Marx não distinguiu o capitalista do empreendedor.  Na realidade, capitalista é todo aquele que consome menos do que produz — que poupa.  Hoje, nos países civilizados, os trabalhadores são capitalistas e suas poupanças reunidas em grandes fundos de pensão e investimentos capitalizam empresas no mundo todo. O empreendedor é todo aquele que vislumbra um desequilíbrio entre a valoração corrente de custos e preços futuros de um produto qualquer, e enxerga nele uma oportunidade de oferecer aos consumidores coisas que eles valoram mais do que o seu custo de produção.  A figura do empreendedor é insubstituível — o estado não pode exercer esse papel.  Isso os comunistas (e não apenas os comunistas!) puderam verificar na prática, para sua tristeza.

No sistema de Marx, como vimos, as trocas pressupõem igualdade de valor entre os bens negociados. Acontece que, como demonstrado acima, as trocas pressupõem precisamente o contrário: desigualdade de valor.  Ou não há troca alguma.  Assim, se a realidade se comportasse como na teoria de Marx, não haveria trocas. Na realidade, ninguém trabalharia sequer para si mesmo, posto que tal atividade envolve uma substituição de um estado atual considerado pelo agente como insatisfatório por um estado futuro reputado como mais satisfatório.  Quer dizer, até o trabalho autônomo envolve uma troca e valores desiguais. O mundo de Marx seria povoado por seres autárquicos, autísticos e estáticos.  Um mundo morto.  Não admira que os regimes socialistas sofram invariavelmente de uma tendência para a completa estagnação e paralisia da atividade econômica.

A lei da preferência temporal

Outra descoberta fundamental, feita por um discípulo de Carl Menger chamado Eugen von Böhm-Bawerk, relaciona-se com a influência do tempo no processo produtivo.  Ele percebeu uma categoria universal da ação humana: as pessoas dão mais valor a um bem no presente do que o mesmo bem no futuro, posto que o tempo é escasso, e logo é um bem econômico.  Os indivíduos ao agirem elegem determinados fins e quanto mais cedo puderem alcançá-los, melhor.

Eugen von Böhm-Bawerk

Partindo desse axioma, ele obteve a explicação definitiva do fenômeno do juro, e mais, que o juro nas operações de crédito financeiras é um caso especial de um fenômeno geral.  A produção demanda tempo; do início da produção até a venda do produto há uma demora, sem falar no risco de o produto não ser vendido. Ocorre que ninguém quer esperar até que a venda ocorra para receber sua parte no total — isso se a venda realmente acontecer, e o preço for recompensador.  Os proprietários dos fatores de produção — os trabalhadores, os proprietários do espaço alugado, os fornecedores de insumos, os donos dos bens de capital — querem receber logo sua parte sem partilhar dos riscos.  Dito de outra forma, eles preferem bens presentes a bens futuros. Mas os bens presentes sofrem um desconto.  Daí receberem menos agora do que receberiam no futuro.  Ficam livres do risco, que é assumido pelo empreendedor e pelos poupadores que lhe outorgaram seus recursos.

A parcela que um determinado trabalhador agrega ao produto final — o valor do produto marginal, como dizem os economistas — pode ou não ser remunerado integralmente. Há frequentemente casos em que o trabalhador recebe mais do que produziu, quando o preço não cobre os custos, o que não tem explicação pela teoria marxista. O capitalista paga a mais-valia ao proletário!  O que é certo é que na economia de mercado há forças operando incessantemente para igualar o salário ao valor do produto marginal. Tanto o lucro quanto o prejuízo são sinais de desequilíbrio. Os prejuízos significam que os compradores não valoram um determinado bem mais do que o dispêndio mínimo corrente para produzi-lo.  Os trabalhadores estão recebendo mais do que o seu trabalho produz.  O empresário tem que reduzir custos para reduzir o preço do seu produto, ou quebra.

O lucro significa que os consumidores valoram um dado bem a um dado preço mais do que o custo de produzi-lo. Os trabalhadores estão recebendo menos do que o valor do produto marginal.  Isso quer dizer que os compradores querem mais desse produto.  O retorno alto atrai a concorrência, o que aumenta a demanda por fatores de produção — trabalho incluso — e faz cair o preço pelo aumento da oferta do produto.  A taxa de lucro baixa e os salários tendem a igualar o valor do produto marginal, descontada a taxa social de preferência temporal — o juro.

Marx nunca compreendeu — ou não quis compreender — que o empreendedor é um preposto dos consumidores e que são estes quem determinam indiretamente o nível de remuneração dos fatores de produção — salários inclusos.  A tarefa dos empreendedores é satisfazer os caprichos dos consumidores.  Nessa função ele deve assumir riscos pois o futuro é sempre incerto.  Nota-se, pois, o absurdo da condenação da produção “para o lucro” pelos marxistas vulgares e sua veneração pela produção “para o uso”.  Sucede que toda produção sempre tem por fim o consumo, i.e., o uso. A produção não é um fim em si mesmo, e sim um meio para se alcançar um fim: o consumo. O lucro e as perdas monetários são sinais fundamentais que orientam os empresários a organizar eficientemente a produção de modo a satisfazer os usos mais urgentemente desejados pelos usuários (pressupondo-se a ausência de privilégios concedidos pelo governo aos produtores em detrimento dos consumidores, tais como tarifas, monopólios, subsídios, licenças etc).

A lei da preferência temporal exerce um papel determinante no processo produtivo.  Se todos os proprietários de fatores (os empregados donos de sua força de trabalho, os fornecedores de insumos, o proprietário do espaço onde a fábrica ou loja se situa, os capitalistas) decidissem partilhar do risco e aguardar até a efetiva venda do produto final total para então dividirem pro rata a receita total, todos eles seriam empreendedores. Como, porém, o ser humano prefere o mesmo bem agora ao futuro (que é sempre incerto), surge a necessidade social de que um indivíduo, ou grupo de indivíduos reunidos (empresa), exerça essa função empreendedorial, que é absolutamente indispensável para o progresso da sociedade.

O empreendedor, assim, paga agora aos proprietários de fatores com bens presentes em troca de receber os mesmos bens (dinheiro) no futuro, correndo o risco de não receber. Esse desconto dos bens presentes em termos de bens futuros, como já assinalado, é o que se chama de juro.

A impossibilidade do cálculo econômico no socialismo

Tendo demonstrado satisfatoriamente que a crítica marxista ao capitalismo é inteiramente equivocada, resta empreender por nosso turno a crítica ao sistema socialista, conforme idealizado por Marx, seus sucessores e outras correntes socialistas. Esse sistema exige a propriedade pública dos meios de produção — terra, trabalho e capital — e o consequente planejamento central de todas as atividades econômicas.

A primeira objeção que vem à mente é a questão dos incentivos: quem planeja e quem obedece às ordens do planejador ou planejadores?  Quem determina o padrão de remuneração dos serviços e que padrão é esse?  Numa sociedade que se presume igualitária, a remuneração deve ser igual para todos os tipos de trabalho?  Nesse caso, o neurocirurgião terá o mesmo incentivo para exercer suas funções que o lixeiro?  Segundo os marxistas, cada um contribui para a coletividade segundo as suas possibilidades e recebe de um fundo comum segundo suas necessidades. Já é possível até aqui imaginar a complexidade do problema.

Pois um discípulo de Böhm-Bawerk, Ludwig von Mises, foi mais além, atingindo a raiz do problema do socialismo, que é ainda mais profunda do que a complicação dos incentivos permite vislumbrar.  Mises descobriu que a atividade econômica em uma economia complexa depende de um cálculo prévio que leve em conta os preços monetários dos fatores de produção. Impossível esse cálculo, impossível a atividade econômica.

Ludwig von Mises

Ocorre que, em uma sociedade socialista pura, todos os fatores de produção pertencem a um único dono: o estado. Sem propriedade privada, os fatores de produção não são trocados e, logo, não têm preço.  A escassez relativa dos fatores de produção e seus usos alternativos fica oculta e o planejador central inexoravelmente é levado a agir às cegas. Mises admitiu, para argumentar, que a questão dos incentivos não apresentasse nenhum obstáculo, que todos se empenhassem diligentemente em suas tarefas.  Ou seja, postula-se que a natureza humana seja aquela que os teóricos socialistas quiserem que ela seja, não o que ela de fato é.  Mesmo assim, na ausência de preços para os fatores de produção, o cálculo econômico é impossível e a atividade econômica se torna caótica, vez que não se pode discernir entre os vários tipos de combinação de fatores aquele que é o mais econômico.

Dado um determinado estado de conhecimento tecnológico, sempre existem inúmeras maneiras de se empreender um projeto econômico qualquer, digamos uma siderúrgica, mas somente se a escassez relativa dos fatores de produção expressa em preços monetários será possível escolher dentre as soluções técnicas possíveis aquela que é mais econômica, ou seja, a que representa os menores custos em relação ao preço futuro do produto final, e só assim será possível avaliar ex ante se o projeto sequer é economicamente viável no momento.

Como nada disso é a priori possível em uma sociedade socialista, todos os empreendimentos tocados pelo estado não passam de um gigantesco desperdício de recursos que mais cedo ou mais tarde leva ao colapso econômico. A experiência comunista comprovou tudo isso, muito embora não tenha nunca existido uma sociedade socialista realmente pura.  A URSS podia usar o sistema de preços do mundo capitalista como referência e copiar seus métodos de produção, e um florescente e gigantesco mercado negro supria até certo ponto as monumentais falhas do planejamento estatal. Mesmo assim, a economia soviética sempre foi um caos.  Funcionou por algum tempo graças ao uso sistemático do terror como “incentivo”.  Mas o terror não pode durar para sempre.  Quando arrefeceu, foi-se o incentivo e a economia comunista anquilosou rapidamente e morreu.

A natureza dispersa do conhecimento

A crítica de Mises publicada em 1920 causou consternação na intelligentsia socialista. Ao menos o desafio foi levado a sério e muitas respostas foram aventadas.  Nos anos 1930, alguns economistas socialistas (Oskar Lange, Abba Lerner) formularam a teoria do “socialismo de mercado”, baseada nas idéias do economista do século XIX Léon Walras, que concebeu um método de equações matemáticas capazes de permitir a compreensão do estado geral de equilíbrio de uma economia.  Tudo o que se fazia necessário, pois, era outorgar certa autonomia aos gerentes das unidades produtivas de modo que igualassem o preço do produto ao custo marginal para que o comunismo funcionasse tão bem como o capitalismo.

Muitos economistas liberais eminentes, como Joseph Schumpeter e Frank Knight, aceitaram a validade dessa solução e se convenceram de que não havia obstáculos econômicos ao socialismo.  Ainda outro economista austríaco, contudo, Friedrich Hayek, discípulo de Mises, desenvolveu certos aspectos implícitos na análise de seu mestre para refutar a “solução” socialista.  O esquema walrasiano padece de um defeito fatal: é estático.  O conhecimento técnico, os recursos e as informações são considerados dados no sistema.  Hayek argumentou que o conhecimento é disperso na sociedade e a sua utilização racional é levada a efeito por cada indivíduo traçando seus próprios planos segundo circunstâncias personalíssimas e intransferíveis.  O mercado coordena esses planos espontaneamente, sobretudo por intermédio do sistema de preços, de forma muito mais racional e útil do que um planejamento central poderia esperar fazer. O planejamento central implica a supressão dos planos individuais.  Os indivíduos tornam-se instrumentos do planejador central, mas esse não pode ter jamais a esperança de coordenar a produção racionalmente. O estado de equilíbrio é uma quimera que não tem lugar no mundo real, dinâmico por natureza, e o conhecimento, as oportunidades e a informação nunca estão “dados”. Ao contrário, estão sendo incessantemente criados e ampliados através das iniciativa individuais e suas interações.

Mesmo assim, Mises e Hayek foram tidos como refutados e relegados ao ostracismo pela comunidade dos economistas.  Mises morreu esquecido em 1973, mas Hayek viveu o suficiente para rir por último quando o comunismo soçobrou e todas as análises de ambos se revelaram certas.  Ele morreu em 1992, após testemunhar a queda do Muro de Berlim e o colapso soviético.

Conclusão

Provar que na economia de mercado não existe mais-valia nem exploração, todavia, não é o mesmo que dizer que a exploração não existe.  Existe.  Ela ocorre quando somos forçados a dar alguma coisa em troca de nada, como no caso dos tributos recolhidos pelo estado.  O estado é a máquina perfeita de exploração.  E o marxismo, por conferir um poder absoluto ao estado, é o veículo insuperável da exploração sistematizada.

A doutrina socialista por ser intrinsecamente falsa leva inevitavelmente a uma perversão e inversão do sentido das palavras, como notou Orwell — por ironia ele mesmo um socialista convicto.  Liberdade é escravidão e escravidão é liberdade; democracia é ditadura e ditadura é democracia; cooperação voluntária é coerção e coerção é cooperação voluntária.  O estado socialista é dono de tudo, o que traduz a triste realidade de que os que comandam o governo são os senhores implacáveis, os proprietários absolutos dos comandados.  Socialismo é mais do que uma restauração da escravidão; é seu aperfeiçoamento e culminância.

Vale lembrar ainda que a análise acima vale para qualquer espécie de socialismo, seja o comunismo (socialismo de classe), nazismo (socialismo de raça) ou fascismo (socialismo de nação).

Tudo o que foi exposto aqui é conhecido há décadas.  Contudo, pouca gente sabe pois a intelligentsia de esquerda bloqueia a sua divulgação.  É uma vergonha, pois uma das tarefas principais dos intelectuais — os que se dedicam ao estudo das idéias — deveria ser justamente a de esclarecer a sociedade a respeito das idéias certas a serem adotadas para o bem comum, e advertir do perigo de se aceitar teorias erradas.  Mas não é isso que acontece, infelizmente.

Parece que os intelectuais sofrem de uma propensão irreprimível para o socialismo, certamente porque nele vislumbram a chance de empalmar o poder absoluto em causa própria.  Em termos marxistas, o próprio marxismo não passa de ideologia, a falsa consciência, que uma classe — a intelligentsia — difunde em função de seus próprios interesses. Essas falsas idéias se propagam e iludem — alienam — as futuras vítimas da classe “revolucionária”.  É um dever inadiável de todo cidadão consciente denunciar esse esquema podre, desmascarar a falácia socialista e esclarecer a opinião pública na medida de suas possibilidades.

A teoria marxista da exploração e a realidade

Por George Reisman. Artigo publicado originalmente no site do Instituto Ludwig von Mises Brasil. Para ler o artigo original, clique aqui.

Dentre todas as vituperações e calúnias proferidas contra o capitalismo, a ‘teoria da exploração’ permanece sendo a mais popular — tanto nos círculos acadêmicos quanto entre os desinformados em geral.  O mais famoso defensor da teoria da exploração foi Karl Marx.

De acordo com a teoria da exploração, os lucros — na verdade, quaisquer outras receitas que não sejam convertidas em salário — representam uma dedução injusta daquilo que deveria ser, naturalmente e por direito, o salário do trabalhador.

Segundo Marx, o que possibilita a um capitalista obter uma renda superior ao salário que ele paga ao seu empregado é exatamente o mesmo fenômeno que torna possível a um dono de escravo auferir ganhos em decorrência do trabalho do seu escravo.  Mais especificamente, um trabalhador é capaz de produzir, em menos de um dia inteiro de trabalho, os bens de que ele necessita para ter a força e a energia necessárias para labutar um dia inteiro de trabalho.

Para utilizar um dos exemplos fornecidos pelo próprio Marx, um trabalhador é capaz de produzir em 6 horas todos os alimentos e todas as necessidades de que ele precisa para ser capaz de trabalhar 12 horas.  Estas 6 horas — ou qualquer que seja o número de horas necessárias para o trabalhador produzir essas suas necessidades — são rotuladas por Marx de “tempo de trabalho necessário”.  Já as horas que o trabalhador trabalha além do tempo de trabalho necessário são rotuladas por Marx de “tempo de trabalho excedente.”

Assim como o ‘tempo de trabalho excedente’ representa a fonte de ganho do dono de um escravo, ele também representa, de acordo com Marx, a fonte de lucro do capitalista.

Quando o trabalhador trabalha 12 horas para um capitalista, seu trabalho, de acordo com Marx, acrescenta aos materiais e aos outros meios de produção consumidos na manufatura do produto final um valor intrínseco correspondente a 12 horas de trabalho.  E, por sua vez, se estes materiais e outros meios de produção demandaram 48 horas de trabalho para serem produzidos, então o produto final conterá estas 48 horas de trabalho mais as 12 horas adicionais de trabalho desempenhado pelo trabalhador.  O produto final, portanto, terá um valor total correspondente a 60 horas de trabalho.

Sendo assim, o processo de produção, de acordo com Marx, resultou em um acréscimo de valor igual às 12 horas de trabalho do trabalhador.  Este valor adicionado pelo trabalho do trabalhador será dividido entre o trabalhador e o capitalista na forma de um salário para o primeiro e de um lucro para o último.  O valor que o capitalista deve pagar como salário, diz Marx, é determinado pela aplicação de um princípio supostamente universal de valoração da mercadoria — a saber, a teoria do valor-trabalho.

O capitalista irá pagar ao trabalhador um salário correspondente às horas de trabalho necessárias para produzir suas necessidades — em nosso exemplo, 6 horas — e irá embolsar o valor acrescentado pelas 12 horas de trabalho do trabalhador.  Seu lucro será aquilo que sobrar após deduzir o salário do trabalhador, e irá corresponder exatamente ao ‘tempo de trabalho excedente’ do trabalhador.

Este exemplo pode ser facilmente expressado em termos monetários ao simplesmente assumirmos que cada hora de trabalho efetuado na produção de um produto corresponde a $1 acrescentado ao valor do produto.  Assim, os materiais e os outros meios de produção utilizados valiam $48, e o produto resultante da aplicação de 12 horas de trabalho do trabalhador vale $60.  As 12 horas de trabalho do trabalhador acrescentaram $12 ao valor do produto.

O lucro do capitalista supostamente advém do fato de que, para as 12 horas de trabalho efetuadas pelo trabalhador, com seu correspondente acréscimo de $12 ao valor do produto, o capitalista paga um salário de apenas $6.  Este valor corresponde ao tempo de trabalho necessário para produzir as necessidades de que o trabalhador precisa para desempenhar suas 12 horas de trabalho.  O lucro do capitalista, portanto, representa a “mais-valia”, que corresponde ao “tempo de trabalho excedente”.

A razão entre a mais-valia e o salário, ou entre o ‘tempo de trabalho excedente’ e o ‘tempo de trabalho necessário’, é rotulada por Marx de “taxa de exploração”.  Nesta nossa ilustração ela é de 100% — ou seja, $6/$6 ou 6 hrs./6 hrs.

Ainda segundo Marx, uma combinação entre a ganância dos capitalistas e as forças que tendem a reduzir o lucro em relação ao capital investido faz com que os capitalistas aumentem a taxa de exploração.  Se os trabalhadores são capazes de trabalhar 18 horas por dia utilizando as necessidades produzidas em apenas 6 horas por dia, então a jornada de trabalho será elevada para 18 horas por dia.  Se os salários que os capitalistas pagam para seus empregados homens for o suficiente para permitir que estes sustentem uma esposa e duas crianças, então os capitalistas irão reduzir os salários para forçar mulheres e crianças a irem trabalhar nas fábricas, dando assim aos capitalistas o benefício de auferir mais ‘tempo de trabalho excedente’ e mais mais-valia.

Os capitalistas também supostamente irão se esforçar para baratear a dieta do trabalhador, substituindo trigo por, digamos, arroz ou batatas, desta forma reduzindo o ‘tempo de trabalho necessário’ e aumentando a fatia do dia de trabalho que passa a ser ‘tempo de trabalho excedente’.  As condições de trabalho, desnecessário dizer, serão sempre horríveis, uma vez que seu aprimoramento geralmente viria à custa de uma redução na mais-valia.

Esta suposta situação de salários de subsistência — aliás, de salários abaixo da subsistência —, jornada de trabalho desumana e condições precárias, além de crianças trabalhando em carvoarias, seria o resultado do funcionamento do capitalismo e da busca pelo lucro, diz Marx, tendo por base sua teoria da exploração.

À luz da teoria da exploração, os capitalistas devem ser considerados inimigos mortais da esmagadora maioria de humanidade, merecendo ser colocados contra paredões e fuzilados — exatamente o que aconteceu sempre que os marxistas tomaram o poder em algum país.

Os capitalistas, e não os trabalhadores, são os produtores principais

Ao contrário do que diz a teoria da exploração, e ao contrário do que a maioria das pessoas imagina, os assalariados que os supostos exploradores capitalistas empregam não são os produtores principais dos produtos manufaturados por uma empresa.  Assim como Cristóvão Colombo foi o descobridor da América, e não os marujos que tripulavam os navios e que foram seus auxiliares na realização de seus (de Colombo) planos e projetos, os capitalistas é que são os produtores principais dos produtos produzidos por suas empresas.

Os empregados do capitalista podem ser mais corretamente descritos como “os auxiliares” na produção dos produtos do capitalista.  Os lucros do capitalista não representam uma dedução daquele valor que, segundo Marx, pertence por direito aos trabalhadores na forma de salários.  Os lucros representam aquilo que o capitalista ganhou em decorrência principalmente de seu trabalho intelectual, de seu planejamento e de suas decisões.  O capitalista produz um produto próprio, embora utilize a ajuda de terceiros cuja mão-de-obra ele emprega com o propósito de implementar seus planos e consequentemente produzir seus produtos.

Sendo assim, por exemplo, Henry Ford era o produtor principal na Ford Motor Company; John D. Rockefeller, na Standard Oil; Bill Gates, na Microsoft; Jeff Bezos, na Amazon; e Warren Buffet, na Berkshire Hathaway.

Marx teve sim uma grande ideia, a qual era em si totalmente correta, e que pode jogar mais luz sobre esta discussão.  Esta sua ideia foi fazer uma distinção entre aquilo que ele chamou de “circulação capitalista” e aquilo que ele chamou de “circulação simples”.  Mas Marx, infelizmente, ignorou por completo e contradisse totalmente as reais implicações desta sua ideia.

Aquilo que todos os “capitalistas exploradores” praticam é a circulação capitalista.  A circulação capitalista, como Marx a descreveu, é o gasto de dinheiro, D, para a compra de materiais, M, que serão utilizados na produção de produtos que serão vendidos por uma quantia maior de dinheiro, D’.  A circulação capitalista, em suma, é D-M-D’.  Se os capitalistas exploradores deixassem de existir, e a circulação capitalista desaparecesse do mundo, os sobreviventes entre aqueles que hoje trabalham como assalariados estariam vivendo em um mundo de circulação simples, isto é, M-D-M.  Ou seja, sem ter com o que gastar inicialmente seu dinheiro, eles tentariam imediatamente produzir materiais, M, os quais eles venderiam em troca de dinheiro, D, o qual, por sua vez, eles usariam para comprar outros materiais, M.

Os capitalistas não são os responsáveis pelo fenômeno do lucro, mas sim pelo surgimento dos salários e dos custos

Tanto Marx quanto Adam Smith, que veio antes de Marx, presumiram erroneamente que, em um mundo de circulação simples — o qual Smith chamou de “o estado rude e primitivo da sociedade” —, todas as rendas obtidas eram salários.  Para eles, não havia lucro neste modelo.  O lucro, segundo eles, só passou a existir quando surgiu a circulação capitalista.  Mais ainda: o lucro seria uma dedução daquilo que originalmente era salário.

Mas a verdade é que, em um mundo de circulação simples, o que está ausente não é o lucro, mas sim os gastos monetários — o D inicial — com o pagamento de salários e com a aquisição de bens de capital, e que são computados como custos de produção.

Um mundo de circulação simples seria um mundo em que não há custos de produção mensurados em termos monetários.  Seria um mundo em que os gastos com materiais — utilizando-se dinheiro obtido com a venda de outros materiais — constituiriam receitas para os vendedores destes materiais.  E estes vendedores, dado que eles não tiveram nenhum gasto anterior para obter os materiais que estão vendendo, não teriam de computar nenhum custo de produção em termos monetários.  Eles teriam apenas receitas de venda. Seria, portanto, um mundo em que o trabalho é a única fonte de renda.  Mas um mundo no qual toda a receita auferida pelos indivíduos é um lucro, e não um salário.  Seria um mundo de trabalhadores produzindo produtos primitivos e escassos, pelos quais eles receberiam receitas de venda das quais eles não teriam custos para deduzir.  Sendo assim, estas receitas representariam o lucro total.

O surgimento da circulação capitalista, portanto, não é responsável nem pela dedução dos salários e nem pelo surgimento do lucro.  Ao contrário: ela é responsável pela criação dos salários, pelo surgimento dos gastos com bens de capital e pelo surgimento dos custos de produção mensurados em termos monetários.  Estes custos serão deduzidos das receitas, produzindo então o lucro.  As receitas de venda, no cenário anterior, representavam o lucro total.  Não havia custos a serem deduzidos das receitas.  Agora, com o surgimento da circulação capitalista, surgiu o salário dos trabalhadores, os quais são deduzidos dos lucros dos capitalistas.  Portanto, primeiro surgiu o lucro; só depois é que surgiu o salário.  É o salário que é deduzido do lucro dos capitalistas, e não o lucro que é deduzido do salário dos trabalhadores.

Quanto mais economicamente capitalista for o sistema econômico, no sentido de um maior grau de circulação capitalista — isto é, uma maior proporção de D em relação a D’ —, maiores serão os salários e os outros custos em relação às receitas, e menores serão os lucros em relação às receitas.  Ao mesmo tempo, se o sistema econômico permitir que os capitalistas se concentrem mais na compra e, consequentemente, na produção e na oferta de bens de capital, este aumento na oferta de bens de capital levará a um aumento na produtividade da mão-de-obra e a um aumento generalizado na capacidade de produção.  A oferta de produtos crescerá em relação à oferta de mão-de-obra e, com isso, os preços cairão em relação aos salários.  O resultado é que os salários reaisaumentarão e continuarão aumentando enquanto a produtividade da mão-de-obra continuar crescendo.

Portanto, no que concerne à relação entre capitalistas e assalariados, a verdade é exatamente o inverso daquilo que é alegado pela teoria da exploração.  Os capitalistas não deduzem seus lucros dos salários dos trabalhadores; os capitalistas são os responsáveis pelo surgimento dos salários.  Sendo um custo de produção, os salários são deduzidos das receitas, as quais, na ausência de capitalistas, representariam o lucro total.  Logo, pode-se dizer que os capitalistas são os responsáveis pelo aumento dos salários em relação aos lucros e pela redução dos lucros em relação aos salários.  Ao mesmo tempo, por meio do aumento na produção e na oferta de produtos, o que leva à redução de seus preços, os capitalistas aumentam o poder de compra dos salários que eles pagam.

Isto não é nenhuma exploração dos trabalhadores assalariados.  É, isto sim, a maciça e progressiva melhoria de seu bem-estar econômico.

A menos-valia

Contribuição à causa feita por Operário Sindicalizado. Artigo proletário original escrito no Jornal Opinião Popular, o jornal dO POVO. Para ler o artigo original, clique aqui. Esta é mais uma contribuição do groucho-marxismo para a ciência econômica progressista e antiburguesa. O tema foi abordado na nossa conferência “O fim do capitalismo: uma perspectiva da Escola de Fuckfurt”, que é parte integrante do ciclo de palestras da Última Internacional.

Marx nos ensina, e todos sabem, que toda a fonte de valor é o trabalho. Ou seja, se uma pessoa achar por acaso numa caverna um pedaço de ouro, ele não terá valor, porque não tem trabalho algum agregado. Inversamente, se um sujeito passar 30 anos cavando um buraco, será um buraco incrivelmente caro, porque tem MUITO trabalho agregado. Não creio que haja dúvidas quanto a isso. Só cães raivosos da burguesia ousariam negar tão óbvio princípio.
Todos sabem também que o lucro da burguesia é ROUBADO dos trabalhadores, a quem só sobra o suficiente para a subsistência. Os trabalhadores produzem tudo, mas só recebem parte do que produzem, enquanto a burguesia vilmente se locupleta. Essa é a mais-valia, o trabalho não pago do proletário.

Bom, essa é a situação de lucro. Mas há uma situação inversa. Digamos que os empresários num certo país são muito burros. Se eles forem muito burros, só farão investimentos errados que acarretarão sempre em prejuízo. Porém os trabalhadores continuarão a receber o salário integral, mesmo que o empregador incorra em prejuízo.

Essa situação excepcional é a MENOS-VALIA, onde os trabalhadores recebem MAIS do que produziram.

Nesse país onde os empresários são idiotas, portanto, não há a exploração dos proletários pelos burgueses, mas dos burgueses pelos proletários. Então, à medida que os burgueses fazem investimentos errados e são explorados pelos seus próprios empregados, sua consciência de classe desperta e os patrões começam a se organizar para fazer a revolução capitalista.

Então, a primeira pergunta que os comunistas e demais pessoas preocupadas com o bem-estar do próximo devem fazer é: será que os empresários do meu país são burros ou inteligentes? Se são burros, haverá a revolução capitalista e tudo será triste. Porém, se são inteligentes, haverá a revolução socialista e tudo será lindo.

Pois eis que chegamos à conclusão óbvia, que o leitor provavelmente já auferiu à esta altura: para que tenhamos empresários inteligentes, o governo precisa investir em educação. Se não houver investimentos em educação, todos serão estúpidos e não saberão fazer projeções de mercado, os empregados não serão explorados e não haverá a conscientização do proletariado nem a revolução comunista.

A Justa Distribuição da Riqueza

Por Manuel F. Ayau, fundador da Universidade Francisco Marroquín.
Conferência dada por Manuel F. Ayau no auditório da Casa Central, a alunos da secundária do Liceo Italo-Guatemalteco, em 18 de março de 1964. Traduzido e adaptado para o português do Brasil por Renan Felipe dos Santos.

Nota do tradutor: quetzal é a moeda guatemalteca. As notações numéricas precedidas por um Q (ex.: Q 25,00) indicam uma quantia de dinheiro nesta moeda.

Manuel F. Ayau

A eterna preocupação da humanidade, tanto no individual como coletivamente, tem sido a de melhorar seu estado, sua condição: tanto no campo espiritual como no material. Realmente, é mais, este é o objeto de toda ação humana.

No campo material, o bem-estar das pessoas depende das coisas ou bens de que dispõem para a comodidade, abrigo e prazer, e também do tempo que dispõem para dedicar às satisfações do espírito.

Mas a riqueza nunca foi abundante nem distribuída de forma igual, e tanto a quantidade de riqueza como sua distribuição são problemas que constantemente preocupam aos homens de boa vontade, aos governos, a igreja, os filósofos, os sociólogos e, claro, os educadores.

Outro dia, uma de minhas filhas que estuda na secundária, me contou na hora do almoço, que no colégio lhe perguntaram se não era injusto que houvesse templos e lugares luxuosos, quando em outras partes da cidade e do país existia tanta pobreza. A pergunta me pareceu tendenciosa, por várias razões. Primeiro, porque a pergunta evidentemente insinuava por si a resposta que qualquer jovem caridoso responderia. Segundo, porque com a pergunta se insinuava a existência de uma relação falsa de causa e efeito entre a riqueza e a pobreza. E terceiro, porque considero tal proceder, como se se estivesse tirando vantagem da juventude, aproveitando sua falta de experiência, sua ingenuidade e sentimentos puros para inculcar sutilmente uma ideia perigosa que causou muito dano ao mundo.

Consciente de tudo isto respondi a minha filha: se a pobreza de uns se deve à riqueza e luxo de outros, a riqueza é má, e estou contra ela. Se a pobreza de uns não se deve à riqueza de outros, sou indiferente à riqueza. Mas se os pobres estariam mais pobres se não existissem os ricos, estou a favor da riqueza.

Desta forma buscava explicar que antes de poder responder a pregunta que lhe haviam feito no colégio, devemos averiguar se a riqueza de uns se deve à pobreza de outros.

Pois bem, façamos uma pequena análise. É certo que há casos em que o que uns ganham é porque outros perderam. Isto é certo, quando a riqueza em jogo é uma quantidade fixa, por exemplo, a loteria: o que uns ganham é o que os outros apostaram e perderam; a quantidade de dinheiro em jogo é o total dos números. A uns cabe o que a outros não cabe. O mesmo quando se jogam cartas, ou se aposta em cavalos: os que financiam os prêmios são o que perdem Quando alguém aposta dois quetzals* com outro, a quantidade de quetzals em jogo é quatro e o ganhador recupera seu investimento de dois quetzals e os da outra pessoa, que os perde: o ganho de um é a perda de outro. O mesmo quando ocorre um roubo.

Agora vejamos o que sucede na produção e troca de bens dentro de uma sociedade baseada na divisão de trabalho, ou seja, onde existe a especialização de trabalho como é hoje em dia, e não como foi em épocas primitivas quando cada um cultivava sua comida, fazia sua roupa, etc.

Quando nessa sociedade existem as duas instituições que mais adiante menciono, quando os bens e serviços se intercambiam, as duas partes ganham, ou seja, a riqueza de ambos aumenta devido ao intercâmbio. Não quero com isto dizer que aumentem na mesma quantidade, segundo o julgamento de um terceiro. Mas sim quero dizer que cada uma das partes que participou da transação ganhou, recebeu mais do que deu.

Como é possível que ambos ganhem? Responderei depois de explicar quais são as duas instituições a que me refiro, e que são condição para que numa troca as duas partes ganhem. Elas são a propriedade privada e a liberdade individual, duas instituições que, cheguei à conclusão, são pouco compreendidas, seus postulados pouco se praticam e menos ainda se respeitam, mas sempre são euforicamente louvadas e colocadas em todas as constituições e declarações de direitos humanos.

Sobre ambas as instituições já se escreveram muitos livros, e sem a pretensão de esgotar o tema, vou tratar de explicar brevemente o que eu entendo por propriedade privada e por liberdade individual com alguns exemplos.

Ambas as instituições só podem existir onde o homem vive em sociedade, porque para um Robinson Crusoé, sozinho em uma ilha, não teria sentido. E ambas as instituições nascem com o estabelecimento das primeiras restrições sobre os atos dos outros. Ou seja, este lápis é meu, porque ninguém pode legitimamente tirá-lo de mim contra a minha vontade. Podem me tirá-lo à força, mas isto viola a instituição da propriedade. Meu direito de propriedade sobre o lápis existe a partir do momento em que os outros tem limitadas a sua liberdade absoluta para fazer o que querem fazer.

Quanto à forma como a propriedade é adquirida, existem apenas três maneiras: produzindo-a, roubando-a ou doando-a. Para efeito de minha tese esta noite, vou levar em conta apenas o que é produzido e trocado legitimamente, porque não vamos perder tempo falando sobre a criação e distribuição de riqueza com base em presentes ou roubo.

Quanto à minha liberdade pessoal, acredito que é a ausência de coerção e imposição por outros indivíduos ou grupos de indivíduos, sobre o que eu escolho fazer, produzir, trocar, ler, cultuar, escrever, etc., Certamente respeitando os direitos iguais dos outros. Ou seja, a ausência de coerção sobre minhas ações, por outros, garante a minha liberdade, e a liberdade de coerção da minha parte, garante a liberdade dos outros. Mais uma vez, sua liberdade e a minha existem desde o momento em que se limita a nossa liberdade absoluta para fazer tudo o que quisermos.

Deixa de existir liberdade quando alguém emprega a força para impedir que executemos alguma ação pacífica, ou quando nos obriga a tomar ação contra nossa vontade.

Por serem ambas, a propriedade e a liberdade, direitos que nascem ao aceitar mutuamente restrições a nossos atos, é que dizia que têm sentido unicamente quando o homem vive em sociedade.

Retornando ao que disse antes, que quando existe propriedade privada e liberdade de produzir e trocar bens ou serviços, ambas as partes ganham na troca, deveria ser evidente, pois nestas condições ninguém atuaria para trocar se não prefere aquilo que vai obter a troco do que vai dar. Ou seja, se não tem menos valor o que dá do que o que recebe. Colocando de outra maneira, o próprio motor que produz a troca, sempre que seja livre de coerção, é a perspectiva de melhorar a sua condição. As pessoas podem equivocar-se ou ser enganadas, mas os equívocos são a exceção se comparadas com o número de trocas que fazemos, e o engano se pratica pouco porque logo o homem aprende que enganando aos outros está fadado ao fracasso. A propósito do engano, alguém sabiamente disse: pode-se enganar alguns por um tempo, mas ninguém pode enganar a todos o tempo todo.

Refiro-me, pois, aos casos normais, à generalidade de trocas, e não às exceções, quando digo que, em uma troca livre de coerção, ambas as partes ganham.

Este ganho mútuo é possível porque nas trocas não se trocam coisas de igual valor. Ainda que a verdadeira comprovação deste feito radique em última instância na teoria do valor subjetivo, e na chamada lei da vantagem comparativa de Ricardo, nesta ocasião utilizarei um exemplo que, ainda que tenha alguns defeitos, talvez nos sirva. Eu produzo uma lata de tinta. Custou-me Q 5,00 produzi-la e a vendo por Q 7,00. Quero conseguir uma lâmpada para minha casa, cujo preço é de Q 14,00 e cujo custo é de Q 11,00. Eu poderia fazer uma troca de duas latas de tinta pela lâmpada, em cujo caso, a equação desde meu ponto de vista é: dou algo que me custa Q 10,00 e obtenho algo que se vende por Q 14,00, ganhei Q 4,00. Quem produziu a lâmpada, dá algo que lhe custou Q 11,00 e recebe algo que vale Q 14,00, ganhou Q 3,00. Se a troca é indireta, ou seja, como é realmente na sociedade moderna, a situação é a mesma, mas, claro, foi feita por meio do dinheiro.

Livre-mercado: trocas voluntárias entre indivíduos livres resultam em ganho para ambos.

É o mesmo, sejam bens ou serviços o objeto de troca num mercado livre de coerção.

Pois bem, tudo isto nos leva a algo muito importante, relacionado à distribuição de riqueza; já que ambas as partes ganham na troca, quando alguma pessoa acumula ganhos é porque tanto ela como outros ganharam. Se eu fabrico um milhão de sapatos e a cada sapato ganho Q 1,00, logo seria milionário, e todos os que compraram de mim também estariam em melhor situação do que se não tivessem comprado, já que se não ganhassem algo em troca, se não obtivessem algo que apreciassem mais do que aquilo que davam, não teriam comprado.

Poderia se argumentar que isto pode acontecer se eu sou o único produtor de sapatos, o monopolista que aumenta o preço do sapato para aproveitar esta vantagem. Isto não pode acontecer quando existe a liberdade de empreender, porque não posso evitar que outros produzam sapatos. O monopólio é a antítese da liberdade: a função primordial de um Estado é manter a liberdade, ou seja, o mesmo que evitar que eu possa impedir a concorrência por meio da força ou intimidação. Poderia dizer-se que sou o único produtor porque eliminei aos competidores baixando o preço do sapato. Mas se eu ganhei um milhão de quetzals baixando o preço do sapato também é certo que o milhão de pessoas que compraram o sapato ganharam mais em sua compra, e que os outros produtores eliminaram a si mesmos ao não poder ganhar vendendo os sapatos a estes preços.

Onde há liberdade também há riscos, e prevalece aquele que serve melhor à sociedade. Fica rico o que dá mais benefício aos demais. São os demais que, ao comprar dele, escolheram livremente enriquecê-lo. Não posso imaginar um exemplo melhor de democracia em ação do que o mercado convertido em plebiscito diário para determinar quem há de triunfar. Por que através de suas compras, cada indivíduo escolhe, livre de coerção, quem há de triunfar.

Assim que do meu ponto de vista, o acúmulo de riqueza, quando há liberdade, é a causa de fazer menos pobres os pobres e por isso, seria não só contraproducente, senão antissocial e inumano, impedi-lo através da força coercitiva que o Estado e a maioria pode exercer. Cabalmente, temos aí onde reside a principal função de um governo: a de manter o estado de coisas, que ninguém possa exercer coerção, ou seja, que exista o maior grau de liberdade possível, para que todos ganhem, para que haja mais riqueza, para que haja menos pobres.

Antes de concluir quero explicar brevemente como se distribui a riqueza num regime de liberdade individual e propriedade privada, ou seja, em um regime capitalista bem guiado, com objetivo de dissipar alguns erros comumente aceitos, e que fazem muito estrago:

Primeiro: não existe hoje em dia dinheiro ocioso, porque salvo exceções, as pessoas com dinheiro que não o utilizam diretamente o guarda nos bancos e é este dinheiro que serve para dar crédito aos que necessitam.

Segundo: criar cada emprego necessita um investimento que varia de zero até Q 70000,00 por posto de trabalho, de acordo com o tipo de emprego. Os empregos que pagam melhores salários são os que mais custam dinheiro para criar. Por exemplo, um investimento na refinaria Matías de Gálvez foi de Q 60000,00 para cada posto de trabalho criado.

Terceiro: os investimentos para criar estes empregos só se podem fazer com o dinheiro que sobra a aqueles que têm mais do que utilizam para viver.

Quarto: quando o rendimento de um investimento é normal, o valor dos bens que se produz a cada ano é igual ou duas ou três vezes maior ao valor do investimento.

Quinto: as rendas líquidas das empresas, quando muito, é gasta a maior parte em salários. O dono do capital recebe uma porcentagem bastante baixa em relação à riqueza criada, mesmo nos casos quando a relação de bem por investimento é alta.

A acumulação de capital é necessariamente prévia à criação de postos de trabalho. E a riqueza criada, devido ao investimento, produz um volume de salários que muitas vezes é maior que o total investido, ano a ano. Este capital, ou pelo menos grande parte, se “redistribui” anualmente e volta a se “redistribuir” ano a ano.

Se, pelo contrário, este capital se distribui diretamente entre os trabalhadores que tivessem empregado o capital a ser investido, ou entre o total da população, receberiam este valor somente uma vez. O certo é que ao contribuir de forma importante na produção, a retribuição do trabalhador é acumulada absoluta e merecidamente. Mas ele não muda o feito de que o investimento de capital teve de ser anterior à criação dos postos de trabalho e para a criação da riqueza que depois se distribui em forma de salários e bens. Se se distribui antes, a capitalização se destrói e tudo isso deixa de acontecer.

A realidade é que hoje não contamos com riqueza suficiente para evitar a pobreza. Nem os países mais ricos estão sem casos de pobreza. Se redistribuímos o pouco que há entre todos, de forma igual, não se aliviaria a pobreza em nada, se eliminaria a pouca acumulação de capital e se paralisaria o processo de criação de riqueza.

Por exemplo: o nível de salários sempre aumentou quando os ganhos são altos. Sempre baixou quando os ganhos são mínimos. E desapareceram por completo os salário ou nem sequer chegam a se estabelecer, quando as perspectivas de ganho são nulas. Ainda que não seja evidente, há muitíssimas pessoas que creem que os salários sejam pagos à custa dos ganhos.

Concluindo, a riqueza total no mundo hoje é maior à de cinquenta anos atrás. A quantidade de riqueza não é fixa: aumenta. O problema não é sua distribuição, mas sim libertar a sua produção. E sustento que “a justa distribuição” é aquela distribuição que resulta quando a riqueza é criada e distribuída sem coerção e respeitando os direitos e liberdades dos demais. E o sustento porque tenho firme convicção e clara compreensão, respaldada pela história, que é assim, ainda que naturalmente de forma imperfeita, que se logra melhorar o nível de vida dos povos. Não é empobrecendo aos ricos que se poderá eliminar a pobreza, mas sim enriquecendo aos pobres, quando as circunstâncias são: que numa troca ambas as partes ganham. Muito obrigado.

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