Për liri! (Pela liberdade!)

Este é um artigo especial, pois o escrevi a pedido de uma amiga minha. Trata de um tema sensível, o direito dos povos a escolher seu próprio governo. Mais especificamente, o direito da minoria étnica albanesa ao seu próprio governo sediado em Kosovo. Mas poderia ser sobre a independência dos bascos, dos catalães, dos galegos, dos chechenos.

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Não há como falarmos da República de Kosovo sem mencionar a Albânia e a Sérvia, países cujas histórias se entrelaçam. Na Antiguidade, a região abrigava os dardânios – povo cuja língua, especula-se, é aparentada do albanês moderno – e seu reino. Depois, a região tornou-se província sob domínio romano. A região esteve alternativamente sob domínio búlgaro ou sérvio pela maior parte da Idade Média até que a Sérvia anexou definitivamente a região ao seu território. O Império Sérvio marcou de modo definitivo o domínio dos sérvios sobre a etnia albanesa da região.

Kosovo, como parte dos Balcãs, também esteve sob domínio do Império Otomano até que a Guerra dos Balcãs (1912-1913) definisse a situação em favor dos nativos eslavos, gregos e albaneses. Neste conflito, a Albânia precisou lutar tanto para expulsar os otomanos quanto para impedir que seu território fosse tomado pelas nações vizinhas (Sérvia, Montenegro, Áustria-Hungria) que não reconheciam seu status de nação. A maior parte de Kosovo, onde predomina população albanesa, foi tomada pelo Reino da Sérvia, novamente. Os reinos da Sérvia, de Montenegro e mais províncias do extinto Império Austro-Húngaro se aglutinaram no Reino da Iugoslávia ao término da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), submetendo mais uma vez os kosovares a uma administração que não falava nem entendia a sua língua. O Reino da Iugoslávia parecia o primeiro governo eslavo para súditos eslavos como sérvios, croatas e eslovenos da História, mas para os kosovares representou apenas uma nova submissão a um governo liderado pelos sérvios.

Os habitantes da região ainda sofreriam duras penas: invasão das potências do Eixo durante a Segunda Guerra (1939-1945), uma tirania comunista (1946-1990) na Guerra Fria e o aumento das tensões étnicas que provocaram guerras e genocídios nas décadas de 80 e 90 e que levaram à dissolução da Iugoslávia.

A partir da década de 90, Croácia, Eslovênia, Bósnia, Herzegovina e Macedônia obtiveram sua independência. Kosovo não teve sua independência da Sérvia reconhecida na década de 90, e voltou a proclamá-la em 2008, mas muitos países ainda parecem coniventes com a submissão dos kosovares a um Estado estrangeiro. EUA, Canadá, Japão, Austrália e a maior parte da Europa Ocidental reconheceram a independência de Kosovo, mas países importantes na política internacional como Rússia, China, Brasil, México e Argentina ainda não tomaram um posicionamento correto sobre o assunto.

Já se passaram mais de 20 anos desde o estabelecimento desta República Parlamentar cuja população ultrapassa a de países como Estônia, Suriname e Montenegro. São duas décadas de uma vida política democrática com eleições, sistema multipartidário, divisão de poderes e relações diplomáticas formalizadas com países do porte dos EUA, Canadá, Alemanha, Austrália e Japão.

Quanto tempo mais a liberdade dessas pessoas terá de aguardar? Quanto tempo mais os habitantes de Pristina terão de temer decisões tomadas em Belgrado? Quanto tempo mais até que o Itamarati se manifeste e reconheça esta nação como um membro da comunidade internacional?

A Guerra de Três Lados – Parte II

Dando continuidade a nossa série de artigos sobre a Segunda Guerra Mundial, nesta segunda parte analisaremos os conflitos e alianças estabelecidos pelas Potências do Eixo e por países na região dos Balcãs e do Mar Adriático. Desta vez, veremos um tipo de relação política muito distinta daquela que vimos no primeiro artigo: aqui não há espaço para democracias e repúblicas parlamentares, aqui a disputa é entre ditaduras monárquicas e regimes nacionalistas em uma encarniçada relação fratricida de submissão, adulação e confronto.

Europa II – Balcãs e Adriático

1. Invasão da Albânia
A Itália começou a penetrar na economia deste país em 1925 através de acordos que permitiam à Itália explorar seus recursos minerais, seguidos do Primeiro Tratado de Tirana de 1926 e do Segundo Tratado de Tirana de 1927, que colocavam Itália e Albânia em uma aliança defensiva. O rei Zog I da Albânia, no entanto, recusou uma renovação do Tratado de Tirana em 1931.

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Após assinar acordos com a Iugoslávia e a Grécia em 1934, Mussolini tentou intimidar os albaneses enviando uma frota de encouraçados ao país. Cinco anos mais tarde Mussolini decidiu anexar a Albânia, proposta esta criticada pelo rei da Itália (Vitor Emanuel III). Roma enviou um ultimado a Tirana em 25 de março de 1939. Zog recusou a proposta e o conflito, ocorrido entre 7 e 12 de abril de 1939, foi vencido rapidamente pelos italianos.

O Parlamento da Albânia votou pela deposição de Zog e pela união da nação com a Itália “em união pessoal”, oferecendo a coroa da Albânia ao rei da Itália. Ficava assim a Albânia submetida ao Reino da Itália.

Posição política da Albânia

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Rei Zog I da Albânia

A Albânia vivia sob uma monarquia constitucional desde 1928: a nova constituição aboliu o senado albanês, criando uma assembléia unicameral, mas o rei Zog I manteve os poderes ditatoriais que já possuía como presidente.

O reino era apoiado pelo regime fascista na Itália, e ambos os países matinham relações próximas até a sua invasão em 1939. A economia era totalmente dependente da Itália e as suas forças armadas eram treinadas por instrutores italianos. Para equilibrar a relação de poder, Zog mantinha oficiais britânicos na gendarmeria, apesar da pressão italiana para removê-los.

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Shefqet Vërlaci, primeiro-ministro após a unificação dos Reinos da Albânia e da Itália.

Como a Albânia não conseguia pagar as dívidas contraídas com a Itália, Roma a pressionava para adotar medidas pró-italianas como a nomeação de italianos para a gendarmeria, cessão dos monopólios sobre açúcar, telégrafos e energia elétrica à Itália, ensino da língua italiana em todas as escolas, admissão de colonos italianos, etc. Zog recusou, e ainda ordenou um corte no orçamento nacional de trinta por cento, demitiu os conselheiros militares italianos e nacionalizou escolas católicas geridas pela Itália no sul do país. Não demorou muito para que Mussolini decidisse invadir o país.

Não querendo tornar-se um fantoche da Itália, o rei Zog e sua família fugiram para a Grécia e então para Londres. Com a sua deposição pelo Parlamento e a subsequente decisão de ceder a coroa da Albânia ao rei Vitor Emanuel III da Itália, os italianos montaram um governo fascista com Shefqet Vërlaci como primeiro ministro até 1941. Este, por sua vez, foi sucedido por Mustafa Merlika-Kruja que assumiu o cargo até 1943.

2. Guerra Greco-Italiana e Batalha da Grécia
Conflito entre a Itália e a Grécia, ambos regimes autoritários de inspiração fascista, de 28 de outubro de 1940 a 23 de abril de 1941. Marca o início da campanha dos Balcãs da Segunda Guerra Mundial e a contra-ofensiva inicial grega é considerada a primeira campanha terrestre bem sucedidade contra o Eixo.

O conflito conhecido como Batalha da Grécia começa com a intervenção do III Reich em 6 de abril de 1941 e termina no dia 30 do mesmo mês com vitória do Eixo sobre a Grécia e os Aliados (Reino Unido, Nova Zelândia e Austrália).

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A invasão da Grécia continental pelo III Reich, ou Operação Marita, foi complementada pela invasão da ilha de Creta pelo III Reich, a Operação Merkur. Juntamente com a invasão da Iugoslávia, estas duas operações foram parte da Campanha dos Balcãs.

Posição política da Grécia

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Rei Jorge II da Grécia

Após um disputado plebiscito, Jorge II retornou para tomar o trono em 1935. Temendo os comunistas, Jorge II apontou Metaxas, o ministro da guerra, como primeiro ministro em 13 de abril de 1936, indicação esta confirmada pelo parlamento grego.

Metaxas, com apoio do rei, declara um estado de emergência em 4 de agosto de 1936, suspende o parlamento e vários artigos da constituição. O regime criado como resultado deste auto-golpe ficou conhecido como “o 4 de agosto”. A propaganda do regime apresentava Metaxas como “o Primeiro Camponês”, “o Primeiro Operário” e “o Pai Nacional” dos Gregos. Metaxas adotou o título de Arkhigos, nome grego para “líder” ou “capitão”, e clamou por uma “Terceira Civilização Helênica”, sucessora da Grécia Antiga e do Império Grego Bizantino na Idade Média.

Metaxas baniu partidos políticos, proibiu greve e introduziu a censura da mídia. Junto com o anti-parlamentarismo, o anti-comunismo formava a segunda maior agenda política do regime: a supressão do comunismo foi seguida pela campanha contra literatura ‘anti-grega’. O próprio Metaxas tornou-se Ministro da Educação em 1938 e reescreveu textos escolares para se adaptarem à ideologia do regime.

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Ioannis Metaxas

Tentando construir um estado corporativo e assegurar o apoio popular, Metaxas adotou ou adaptou muitas instituições da Itália fascista: o Serviço de Trabalho Nacional, jornada de trabalho de oito horas, melhorias compulsórias nas condições de trabalho, o instituto de segurança social.

Metaxas era neutro na política externa, tentando um equilíbrio entre Reino Unido e Alemanha. O próprio Metaxas tinha uma reputação de germanófilo, mas o rei Jorge e as elites do país eram anglófilas, e a predominância da Royal Navy britânica no Mediterrâneo não podia ser ignorada por um país marítimo como a Grécia. Os objetivos expansionistas de Mussolini inclinaram a Grécia a uma aliança franco-britânica, embora a literatura do regime fosse elogiosa a estados autoritários, especialmente os de Franco, Mussolini e Hitler.

3. Invasão da Iugoslávia
Ataque do Eixo liderado pelo III Reich ao Reino da Iugoslávia que se iniciu em 6 de abril de 1941. A invasão começou com um ataque aéreo da Luftwaffe (força aérea alemão) à cidade de Belgrado e às instalações da Força Aérea Real Iugoslava, além das forças terrestres alemãs estacionadas no sudoeste da Bulgária, seguidas de invasões alemãs partindo da Romênia, Hungria e Áustria (então parte do III Reich).

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As forças italianas se limitaram a ataques aéreos e de artilharia até 11 de abril, quando o exército italiano atacou Ljubljana. No mesmo dia, forças húngaras entraram em Bačka e Baranya, mas como os italianos não encontraram resistêncio. Um ataque iugoslavo no norte do protetorado italiano da Albânia foi inicialmente bem sucedido, mas inconsequente devido ao colapso do resto das forças iugoslavas.

A invasão terminou com a rendição incondicional do Exército Real Iugoslavo em 17 de abril de 1941. A Iugoslávia foi então ocupada e dividida pelas potências do Eixo. Algumas áreas foram anexadas por países vizinhos, outras permaneceram ocupadas e em outras, estados-fantoche como o Estado Independente da Croácia (Nezavisna Država Hrvatska, or NDH) foram criados.

Posição política da Iugoslávia

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Príncipe regente Paulo da Iugoslávia

A Iugoslávia vivia sob uma ditadura monárquica até que o rei e ditador Alexandre I da dinastia sérvia de Karađorđević foi assassinado na França, em 1934, por um membro da IMRO (Organização Revolucionária Interna Macedônia), em conluio com a Ustasha – movimento revolucionário banido do país, e que viria a governar o Estado-fantoche da Croácia após a invasão nacional-socialista. Como o filho mais velho de Alexandre, Pedro II, era menor de idade, um conselho regente composto de três pessoas assumiu o governo. O conselho era dominado pelo primo do rei de jure, Príncipe Paulo.

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Ante Pavelič, líder da Ustaša e do Estado-fantoche da Croácia

Temendo uma invasão do Eixo, o príncipe regente Paulo assinou o Pacto Tripartite em 1941, jurando cooperação com o Eixo. Em 27 de março, o regime foi derrubado por um golpe militar com apoio britânico. Pedro II, então com 17 anos, foi declarado maior e posto no comando do país. O Reino da Iugoslávia removeu seu apoio de facto ao Eixo sem renunciar formalmente ao Pacto Tripartite.

O novo governo se opunha à Alemanha Nazista, mas temia um ataque à Iugoslávia e tampouco o Reino Unido estava em condições de ajudar. Hitler não arriscou esperar a decisão dos britânicos e atacou.


Comentário:

Diferente do que vimos na primeira parte desta série, nestes outros três casos tivemos dois conflitos praticamente fratricidas entre regimes nacionalistas e um caso onde a oposição ao nacional-socialismo foi forte o suficiente a ponto de derrubar um governo pró-nazi.

No caso da Albânia, uma monarquia constitucional praticamente submetida à autoridade italiana, bastou uma resistência maior ao controle italiano para que o seu Estado tutelar a invadisse e obtivesse do Parlamento de bom grado o governo do país e a deposição do antigo monarca. No caso da Grécia, também uma monarquia com um governo fascista, seria fácil para o Eixo obter uma aliança não fosse a presença dos britânicos no Mediterrâneo – aqui tivemos um exemplo claro de um governo fascista que se aliou a uma democracia ocidental para defender-se da agressão de outro governo fascista. No caso da Iugoslávia, o regime monárquico pró-nazismo e potencial aliado do III Reich foi deposto – supostamente com intervenção britânica – para dar lugar a um outro regime monárquico,  anti-nazista porém moderado. Uma manobra política que, ainda que bem intencionada, não preservou o país da reação de Hitler: a imediata invasão do país.


Leia também:

Sete razões para não temer os muçulmanos

Nota de 27/01/2017: Este artigo foi escrito 4 ou 5 anos ANTES da crise migratória européia (2016-?) e, portanto, não leva em consideração a imigração massiva de países muçulmanos para a Europa. A assimilação pacífica da comunidade muçulmana aos países europeus e americanos só foi possível em séculos anteriores porque esta migração se dava de maneira individual e paulatina, não massiva e repentina como vem ocorrendo nos últimos anos. Sobre o caráter islâmico (ou não) do terrorismo, o autor em breve publicará uma revisão deste artigo.


1 – O terrorismo “islâmico” não existe
Yuri Bezmenov, dissidente do serviço secreto soviético, já explicava isso décadas atrás: “Believe me please, there was no grass, no root, no revolution, and least of all Islam. There is no such thing as an Islamic revolution. Revolution has nothing to do with Islam. There is no such thing as Islamic terrorists. (Em negrito: “Não há revolução islâmica. Revolução não tem nada a ver com Islã. Não existem terroristas islâmicos.”)

Diversos líderes de movimentos africanos, indianos, árabes e sul-americanos de “libertação nacional” foram treinados por oficiais da própria KGB (no caso dos sul-americanos, em Cuba) em seus centros de formação de líderes políticos durante a Guerra Fria. Eestes mesmos líderes levaram adiante guerras civis, golpes e revoluções armadas de todo tipo a seus países de origem para desestabilizar os regimes e, se possível, instalar um governo socialista alinhado com o Kremlin.

Hoje, membros destes mesmos grupos “islâmicos” operam redes internacionais de terrorismo. Portanto, é mais fácil traçar a origem dos terroristas “islâmicos” até a KGB ou a CIA do que ao Corão.

2 – Religião islâmica e lei islâmica não são sinônimos
Dos aproximadamente cinquenta Estados de população majoritariamente islâmica, apenas 6 são Estados islâmicos. E destes seis, dois são aliados dos EUA (Arábia Saudita e Paquistão). Outros doze tem o islamismo como religião oficial. Vinte são Estados seculares.

Dos estados do mundo, cerca de 14 adotam leis religiosas. Dentre estes, os mais conhecidos são o Irã, a Arábia Saudita, o Iêmen e o Vaticano. O mais poderoso destes, em relação ao Oriente Médio e toda a Liga Árabe, é a Arábia Saudita, país que mantém sólidas relações comerciais e diplomáticas com os EUA.

3 – Muçulmanos são tão diversos quanto os cristãos
Assim como entre os cristãos, há diferentes denominações muçulmanas.

A maior delas é o Sunni (sunitas). É considerada a versão “ortodoxa” da religião. Os sunitas acreditam que após a morte de Maomé, o novo líder religioso seria eleito e não um descendente, parente ou indicado do profeta Maomé. Possui quatro escolas de pensamento: Hanafi, Maliki, Shafi’i e Hanbali. Há uma quinta, ultra-ordoxa, a Wahabbi.

Os sunitas acreditam na autoridade religiosa da razão e da legalidade.

Os xiitas são a segunda maior denominação muçulmana. Compoem de 10 a 20% da população muçulmana mundial. Creem na infalibilidade do Imam (seu líder religioso) – descendente de Ali, o sucessor de Maomé na liderança dos muçulmanos.

Os xiitas acreditam na autoridade religiosa hereditária e divina.

Além dos sunitas e xiitas, há os sufis, os ahmadiyya, os ibadi, os coranistas, etc.
Some a isso as culturas locais de povos que vão desde os africanos do Mali até os indonésios passando pelos turcos, persas e uigures.

Diferenças entre culturas: tártaras em trajes típicos, uma albanesa votando e iranianas comprando cosméticos e maquiagens.

4 – Os muçulmanos são bons de negócio

Reformas: Metade das economias no mundo árabe reformaram suas regulamentações em termos de negócio nos anos de 2009 e 2010, mais do que na América Latina e no Caribe.[1]

Liberdade econômica: De acordo com o ranking da Heritage de liberdade econômica, Irã, Turcomenistão, Mauritânia, Iêmen, Indonésia, Marrocos, Jordânia e Catar apresentaram melhorias.

Bahrain e Catar fazem parte dos países majoritariamente livres (score entre 79.9 e 70)

Jordânia, Cazaquistão, Kuwait, Turquia, Marrocos, Quirguistão, Malta, Arábia Saudita e Líbano fazem parte dos países moderadamente livres (grupo que inclui Israel, Coréia do Sul e África do Sul).

Azerbaijão, Egito, Tunísia, Iêmen, Paquistão, Tadjiquistão, Bangladesh, Mauritânia, Indonésia e Mali se encontram no grupo majoritariamente reprimido. Fazem parte deste grupo membros do BRIC (Brasil, Índia, Rússia e China).[2]

Desenvolvimento econômico: A Liga Árabe, composta por países muçulmanos em maioria, é a 6ª organização com maior PIB, estando à frente da Rússia. Em termos de PIB per capita, está à frente da China e da Índia. A mesma mantém relações comerciais com a União Africana, a União Européia, os Estados Unidos, a China e a UNASUL.

Direitos de propriedade: Com relação à defesa dos direitos de propriedade, os países do norte da África e do Oriente Médio (muçulmanos em sua maioria) estão melhores do que a América Latina e Caribe. De acordo com o International Property Rights Index de 2011, a região Norte da Áfica e Oriente Médio tem uma média de 5.7, superando os 5 pontos da América Latina e Caribe.[4]

Comparando-se o PIB per capita, o “mundo islâmico” não se sai tão mal quando comparado com os países do BRIC:

Os países mais próximos do roxo são os com o mair PIB per capita. Em comparação com os BRICS, o mundo islâmico não está muito atrasado, inclusive contando com membros excepcionais que se aproximam mais dos níveis europeus.

Com relação ao IDH, muitos países tipicamente muçulmanos são mais desenvolvidos do que os tais BRICs. A Rússia é o membro do BRIC com o maior IDH (0.755), e está atrás da Líbia (0.760) que é o 6º país muçulmano num ranking de IDH. À frente da Líbia ainda está o Kuwait, a Arábia Saudita, o Bahrain, o Catar e o mais desenvolvido deles, os Emirados Árabes Unidos com invejáveis 0.855. Para se ter uma idéia, o IDH do Brasil (2º entre os BRICs) é de 0.718 e o da Índia (menor entre os BRICs) é de 0.547. [5]

Vale lembrar que um dos maiores parceiros comerciais dos EUA no mercado de Petróleo é a Arábia Saudita. [6]

5 – Judaísmo, cristianismo e islamismo são parentes
Judaísmo, cristianismo e islamismo fazem parte de um mesmo grupo de doutrinas religiosas. São as chamadas religiões abrâmicas (relativo a Abraão). Abraão é o profeta que “faz a liga” entre estas três religiões.

Ainda que elas tenham grandes diferenças entre si, há também pontos em comum. O deus, por exemplo, é o mesmo. O deus dos judeus é o mesmo deus dos cristãos e o mesmo deus dos muçulmanos. A palavra “Allah” vem do árabe e significa simplesmente “deus”.

Abraão. Pintura de József Molnár.

Basicamente, os muçulmanos não afirmam que judaísmo ou cristianismo são religiões falsas. Na concepção muçulmana, estas religiões estão ligadas ao islamismo. Os muçulmanos usam a expressão “adeptos do livro” ou “seguidores do livro” para referir-se a judeus e cristãos. Mas porque não usam a palavra “infiel”? Por que consideram que há três livros sagrados, revelados progressivamente: o primeiro é a Torá, o segundo é a Bíblia (no caso, o Novo Testamento) e o terceiro é o Corão.

Os muçulmanos não aceitam Jesus como filho de Deus, mas o aceitam como profeta e duvidam da sua morte carnal afirmando que ele ascendeu aos céus diretamente para a presença de Allah. Jesus é considerado um profeta do Islã, como é Maomé. O motivo pelo qual os muçulmanos dão tanta atenção a Maomé é porque ele é considerado nesta religião o último profeta a receber revelações diretamente de Allah. A crença é de que Allah tenha ditado o livro sagrado (Corão) para Maomé ao longo de um período de 23 anos nas peregrinações entre duas cidades (Medina e Meca).

O que o Islã condena não é o judaísmo ou o cristianismo, mas o politeísmo e o ateísmo (a palavra “infiel” se refere a quem não é adepto dos livros sagrados).

Outras coisas que podemos constatar: a proibição do consumo da carne de porco e a cultura de cobrir a cabeça das mulheres vem desde o judaísmo. Ainda hoje, judeus e muçulmanos não comem carne de porco – algo comum para cristãos. Judias ortodoxas cobrem a cabeça até hoje. Entre as cristãs, o costume de cobrir a cabeça ficou restrito às freiras, não sendo imposto às cristãs leigas.

As três religiões abrâmicas tinham a cultura do véu. Com o tempo, o costume do uso foi sendo abandonado por correntes do judaísmo, e entre os cristãos o seu uso acabou restrito a freiras e irmãs. Entre a maioria dos muçulmanos esta cultura resiste. Em países como a Albânia e a Turquia, o uso varia conforme as tradições familiares.

Tanto cristianismo quanto o islamismo são religiões expansionistas, o que significa que ambas buscam expandir o número de fiéis através da conversão. Longe de serem ideologias destrutivas ou xenofóbicas, elas buscam a assimilação e são universalistas.

A julgar que, historicamente, entre os cristãos católicos e protestantes já houveram grandes e violentos conflitos que acabaram posteriormente sendo esquecidos para dar lugar à convivência pacífica sob o princípio do ecumenismo, não é difícil conceber que se possam conciliar as três religiões abrâmicas como outrora foi feito na Espanha moura, durante o período conhecido como La Convivencia.

6 – O que muçulmanos vestem, comem ou fazem não é da nossa conta

É tão simples quanto poderia ser: cada cultura tem seus códigos de etiqueta, sua culinária, sua música e claro, seu código alimentar e de vestuário. O fato de nós ocidentais termos mais liberdade em vestir o que nos convém não indica que há algo no hijab, niqab ou na burqa que os torne intrinsecamente ruins e opressores.

Escoceses usam kilt, árabes usam dishdasha. Problem?

Devemos entender que para a maioria das mulheres muçulmanas, vestir-se do modo como se vestem é normal, digno e belo. Dentro da cultura ocidental, com o regimento das leis, estas mulheres tem o direito de recusar o uso dos mesmos, mas obrigá-las a tirar (como foi feito na França) é uma tirania. Se somos pela liberdade, não podemos jamais admitir que o governo dite o que um cidadão deve ou não deve vestir.


O mesmo vale para a alimentação. Muçulmanos, assim como os judeus, não comem carne de porco porque ela vai contra um código alimentar instituído pela religião e pela tradição. No caso dos judeus, é o kashrut e no caso dos muçulmanos, é o halal. Para os muçulmanos, a carne precisa ser preparada de um modo especial para que possa ser consumida (halal = permitido), do contrário ela não pode ser consumida por um muçulmano (haram = proibido). Isto significa que para atender a um consumidor muçulmano ou judeu, certas regras e padrões culturais devem ser atendidos no preparo das refeições. É um direito do consumidor escolher não consumir os produtos que vão contra a sua crença religiosa, e isso é de fundamental importância.

Por último, mas não menos importante, é a questão da política e da religião. Por mais que as leis dos países islâmicos possam nos ser estranhas (sobretudo naqueles onde a Sharia é a lei), temos que entender que as leis serão estranhas para nós em qualquer sistema político diferente daquele que estamos acostumados.

Nós ocidentais temos padrões ocidentais e leis que seguem escolas de pensamento ocidentais. Os muçulmanos, que são africanos, orientais e asiáticos em sua maioria, não seguem os mesmos padrões que nós. Os sistemas políticos que se desenvolveram nestas culturas está adaptado a elas e foi desenvolvido e mantido por elas. Cabe a elas decidir quando, como e o que mudar.

Amamos a democracia e a liberdade de expressão e culto, e devemos assegurá-la sobretudo aqui nas Américas ou na Europa, mas não temos nem o dever e nem o direito de querer impor nossos sistemas na “casa” dos outros. Contanto que a democracia, o rigor da lei, a liberdade e a propriedade estejam asseguradas no Ocidente – para os muçulmanos que aqui vivem, inclusive – estaremos com nosso dever cumprido. Antes de nos preocuparmos com o que se passa lá, temos que dar especial atenção aos valores que cultivamos aqui: liberdade de culto, liberdade de expressão, liberdade de escolha.

7 – Eles estão entre nós
Na Europa: Dentro da Europa, as tradições islâmicas são encontradas sobretudo em territórios que já estiveram sob administração do Império Otomano, como os balcãs, e no tartaristão (Federação Russa). A península ibérica também já foi islâmica, tendo sido reintegrada à Cristandade durante a Reconquista.

Na Albânia, o congresso muçulmano sediado na capital (Tirana) rompeu com o Califado em 1923, estabelecendo uma nova forma de culto, banindo a poligamia e instituindo o uso do véu para as mulheres em público.

Na Polônia, as tradições sunitas tártaras foram preservadas. Isto levou à formação de uma distinta cultura muçulmana na Europa Central, na qual elementos da ortodoxia muçulmana misturaram-se à tolerância religiosa de uma sociedade relativamente liberal. Os tártaros polacos são considerados um exemplo de sucesso na integração sócio-cultural com a sociedade cristã.

1 – uma pequena mesquita na Polônia. 2 – a grande mesquita Qolşärif em Kazan, capital do Tataristão. 3 – Um casamento tártaro. Os tártaros são um povo majoritariamente muçulmano que vive na Rússia, na Ucrânia e na Polônia.

Entre os europeus, acredita-se que esteja emergindo uma nova ramificação do islã que combina os princípios e deveres desta religião com valores da Europa pós-iluminista como direitos humanos, o estado de direito, a democracia e a igualdade entre homens e mulheres.

Acredita-se que a população muçulmana na Europa hoje seja superior a 53 milhões, mais de 7% da população. Em alguns países europeus esta proporção é ainda maior: Bulgária, Montenegro e Rússia tem entre 10% e 20% de população muçulmana. O Chipre, entre 20% e 30%. Macedônia, entre 30% e 40%, Bósnia e Herzegóvina entre 40% e 50%, na Albânia são entre 80% e 90%, e em Kosovo chega a 95%.

Nos Estados Unidos: Entre os anos de 1880 e 1914, milhares de muçulmanos migraram do Império Otomano para os Estados Unidos, assimilando-se à sociedade. Graças à imigração, a conversão e altas taxas de natalidade, os Estados Unidos viram a sua população muçulmana crescer muito nos séculos XX e XXI. Só em 2005, o número de novos residentes muçulmanos legais nos estados unidos foi de aproximadamente 96.000: mais do que em qualquer ano das duas décadas anteriores.

O seriado “All-American Muslim” foca no dia-a-dia de americanos muçulmanos.

A mais duradoura comunidade muçulmana incorporada à sociedade norte-americana é a dos bósnios, que em 1906 criaram a Džemijetul Hajrije (Jamaat al-Khayriyya), uma organização de serviços sociais para muçulmanos bósnios. Os muçulmanos bósnios também abriram a primeira escola dominical muçulmana com currículos e literatura muçulmana. A primeira organização muçulmana em Nova Iorque, a Sociedade Maometana Americana, foi fundada em 1907 por tártaros Lipka da região de Podlasie (Polônia). Em 1915 foi fundada aquela que provavelmente é a primeira mesquita americana, por muçulmanos albaneses em Biddeford, Maine. Um cemitério muçulmano ainda existe lá. E esta história se arrasta pelo século seguinte.

O número estimado de muçulmanos vivendo nos EUA hoje é de 2,6 milhões – menos de 1% da população.

Centro Islâmico da América em Dearborn, Michigan

No Brasil: A imigração árabe no Brasil tem início com a chegada de imigrantes árabes que começaram a desembarcar no País em fins do século XIX. No início do século XX, esse fluxo imigratório cresceu e passou a se tornar importante. Um fator predominante foi a Primeira Guerra Mundial, que acelerou a imigração de pessoas que viviam no Império Otomano. Outros conflitos que causaram aumento na imigração de muçulmanos foram as guerras no Oriente Médio (Guerra do Líbano, conflitos entre árabes e israelenses, conflitos no Iraque).

Porém, a imigração de muçulmanos para o Brasil é muito anterior. Muitos dos negros escravizados na África e trazidos para o Brasil já eram muçulmanos. A chamada Revolta dos Malês de 24 a 25 de janeiro de 1835, ocorrida na cidade de Salvador, foi uma sublevação de escravos africanos de religião islâmica. “Malê” era o termo que se utilizava para referir-se aos escravos muçulmanos.

Atualmente, 15 milhões de brasileiros possuem ascendência árabe. A maioria é de origem libanesa, enquanto o restante é, predominantemente, de origem síria. O Islã no Brasil conta com 27.239 seguidores, segundo dados do censo demográfico de 2000 do IBGE. Porém, algumas instituições islâmicas brasileiras consideram que o número de seguidores é muito superior a isso. A Federação Islâmica Brasileira defende que há cerca de 1,5 milhão de fiéis do Islã no país.

Mesquita Omar Ibn Al-Khattab, em Foz do Iguaçu, Paraná. A cidade abriga a maior comunidade muçulmana do Brasil.

Na cidade de São Paulo existem cerca de dez mesquitas, dentre as quais a Mesquita Brasil, na Avenida do Estado (centro da cidade) – cujas obras de construção começaram em 1929 e que foi a primeira mesquita edificada na América Latina.

No mundo: Somos praticamente 7 bilhões. Cristãos são entre 1,9 e 2,1 bilhões – ou seja, de 29% a 32% da população do mundo. Os muçulmanos são cerca de 1,57 bilhões – de 20 a 25%. Com toda essa gente, é melhor arranjar uma maneira de conviver. Para isto, existe o que chamamos de diálogo inter-religioso. Com relação à Igreja Católica, já existe uma iniciativa de diálogo entre católicos e muçulmanos: em 2008 reuniram-se no Vaticano autoridades religiosas católicas e islâmicas para um diálogo inter-religioso, e há uma iniciativa para que esta cúpula seja permanente. A primeira cúpula produziu um documento que afirma um compromisso mútuo de incentivo à tolerância. O mesmo pode ser lido em inglês aqui.

Não fuja do conflito: Talvez você tenha vizinhos muçulmanos, ou já os tenha visto caminhando nas ruas da sua cidade. É possível que você passe pela frente de centros muçulmanos sem nem perceber. Para vencer as barreiras impostas pela caricaturização típica da propaganda de guerra com que somos bombardeados diariamente, é necessário conhecer “o inimigo”. Ouse ler o Corão, permita-se conversar com muçulmanos, visite um centro islâmico. Você verá que mais do que diferenças, há muitas semelhanças entre você e eles: a valorização da família, um senso de responsabilidade, um desejo forte de ascender na vida honestamente, a dedicação aos estudos, etc. Encerro este artigo com uma citação de Chesterton:

A Bíblia nos manda amar nosso próximo, e também nossos inimigos; provavelmente porque eles são, geralmente, a mesma pessoa.

– G. K. Chesterton